Investimentos ESG: Uma saída prática para a preservação ambiental, por Paola Pellacani

A temática ambiental é conhecida pelo mundo corporativo há décadas, quando em 1992 foi realizada a Conferência das Nações Unidas no Rio de Janeiro para discutir aspectos relacionados à questão do desenvolvimento econômico e meio ambiente. 

Embora esse seja um tema antigo, nem sempre foi tratado com atenção pelo setor privado. Este priorizou a maximização dos lucros no curto prazo, relegando investimentos de longo prazo, como ocorre na antiquada utilização de Carvão Mineral como fonte de energia - não renovável e com alto teor de emissão de Carbono - em detrimento de investimentos consistentes em energias limpas e renováveis, que demandam maior prazo para retorno dos investimentos. Conduta semelhante também ocorre no setor público: aqui, as políticas ambientais ficam concentradas na remediação de danos.

O tema ‘meio ambiente’ voltou aos holofotes da sociedade civil e do mundo corporativo no cenário pós-pandemia de Covid-19, junto com os temas ‘governança corporativa’ e ‘responsabilidade social’. O mercado financeiro concentrou tais preocupações sob o conceito dos princípios ESG, do inglês, Environmental, Social and Governance.

Os efeitos econômicos do isolamento social, recomendado como medida de controle da pandemia, e a sobrecarga dos sistemas de saúde e das ferramentas de Saúde Pública, também evidenciaram, principalmente o setor privado a necessidade do cuidado com o Social tanto na disponibilização de serviços públicos de forma socialmente equânime, quanto na atuação do estado como estabilizador da economia.

A COVID-19 também abriu uma série de reflexões sobre a importância e a necessidade de tanto entidades privadas quanto a própria população cuidarem do meio ambiente. Sabe-se que o desequilíbrio ecológico é um dos fatores que propiciam o avanço de doenças já conhecidas e a inserção de novas doenças no meio humano. Carvalho (2020, p.93) cita que algumas epidemias resultam de processos evolutivos naturais dos patógenos ao longo do tempo, enquanto outras surgem como consequência da ação antrópica, em razão da degradação do meio ambiente. 

Especificamente no Brasil, a escalada das queimadas no Pantanal e na Amazônia em meio, de um lado, a uma crise sanitária e, de outro, ao registro de recordes de focos de calor aliados à dificuldade de articulação, por parte do governo federal, para contenção do alastramento das queimadas, evidenciou a necessidade de proteção ao meio ambiente por parte da sociedade civil organizada, na tentativa de suprir minimamente a ausência do Estado, que deixou de exercer o seu papel. 

Queremos, aqui, refletir sobre uma saída para a preservação ambiental que seja palpável e tempestiva, passando pelo investimento em projetos reais com efeito direto na economia e no desenvolvimento do país, contribuindo para uma economia verde, de baixo carbono e minimamente sustentável.

Alvarenga Junior e Youg (2020, p.186) destacam que caberá à iniciativa privada grande parte dos esforços produtivos sob o paradigma da economia de baixo carbono, captando fundos para os investimentos necessários à transição da economia para o rumo da sustentabilidade.

A integração entre o poder público e a iniciativa privada pode ser um caminho a ser seguido. Gramkow apresenta a ideia do Big Push Ambiental, caracterizado como um instrumento que representa uma articulação e coordenação de políticas (incluindo públicas e privadas) que possibilitem investimentos nacionais e estrangeiros para produzir um ciclo virtuoso de crescimento econômico e promotor de sustentabilidade. (2019, p.1).

Sabemos que a transição para uma economia verde não ocorre de forma espontânea. Aqui emerge o papel do Estado como incentivador dessa transição com auxílio de instrumentos legais e seus órgãos reguladores. Nesse sentido, o novo cenário de valorização dos princípios ESG abre uma janela de oportunidades para o Brasil deixar de encarar as questões de preservação ambiental como um inconveniente e passar a analisar o tema como uma solução para captação de recursos em investimentos no país. 

A Política Nacional de Meio Ambiente - Lei 6.938 de 31 de agosto de 1981 (Brasil, 1981) cita que é papel do Estado atuar de forma a manter o equilíbrio ecológico e proporcionar a compatibilização do desenvolvimento econômico-social com a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico, assim como compete ao Estado desenvolver critérios e padrões de qualidade ambiental para que as atividades econômicas desenvolvam-se respeitando e contribuindo com a sustentabilidade socioambiental.

Embora a função do Estado seja bem definida, é perceptível uma complacência por parte do atual governo brasileiro com o setor privado quando não há o cumprimento das políticas públicas de sustentabilidade ambiental em vigor, o que nos faz acreditar que seguimos na contramão das práticas sustentáveis de desenvolvimento, o que vai de encontro aos princípios ESG, uma vez que seus investidores prezam por negócios que tenham retorno e sustentabilidade ao longo do tempo.

O Brasil carrega um histórico de necessidade de atenção aos temas socioambientais, que hoje se reflete no baixo índice de cobertura de saneamento, na dificuldade de conscientizar a população sobre a necessidade de preservação de áreas de proteção e conservação ambiental, no esforço que precisa ser feito para manter as crianças e adolescentes matriculados na educação básica e com níveis mínimos de rendimento, no déficit habitacional ainda existente e no quantitativo de ocupação de áreas impróprias para habitação humana.

Quando se fala em incentivar investimentos em economia verde, uma das formas mais pensadas é através da concessão de incentivos fiscais e financiamentos subsidiados, no qual o Estado teria papel fundamental no patrocínio dessas ações. Entretanto, embora justa e eficiente, esse é um passo que não podemos esperar do modelo de gestão atual.

Há que se considerar que os investimentos em projetos com os mínimos critérios ESG já ocorrem por meio de alguns fundos internacionais. O caso mais emblemático foi protagonizado pelo Blackrock Investment Institute assinado por Fink (2020) quando, no início de 2020, enviou carta aos CEOs alertando que o risco climático passa a ser considerado um risco de investimento no longo prazo e decide pelo desinvestimento em empreendimentos com alto risco de sustentabilidade. 

Assim, percebemos que há espaço não só para inserir a participação do mercado financeiro em investimentos brasileiros que busquem preservar a sustentabilidade ambiental, como elaborar uma sistemática de padronização de critérios para ações e resultados sustentáveis que seja aplicável aos padrões brasileiros e esteja alinhada aos índices internacionais. 

Não há como eximir o Estado de sua responsabilidade em participar do desenvolvimento de ações de incentivo à agenda ambiental com tantos impactos sociais que a omissão ao tema causou ao longo dos anos. Entretanto, em uma situação em que a gestão governamental não implementa sequer as políticas públicas vigentes e que sociedade civil organizada e terceiro setor passam por um processo de sufocamento, buscar espaço junto ao mercado financeiro para implementar ações efetivas de sustentabilidade ambiental, social e governança corporativa parece emergir não apenas o melhor caminho, mas o único disponível.


Paola Pellacani 

Paola Pellacani é Engenheira Ambiental, especialista em Administração de Empresas (FGV), Especialista em Investimentos (ANBIMA) e pós-graduanda em Finanças, Investimentos e Banking (PUCRS).Em 2021, participou do Curso 2020 oferecido pelo Desajuste, para o qual, produziu o artigo publicado hoje.




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